O
coletivo de mídia Ninja – Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação surge a
partir de experiências com comunicação desenvolvidas pelo Circuito Fora do
Eixo- FDE, rede de coletivos que cria rotas e produz eventos culturais em todo
o país desde 2005. Atualmente a sustentabilidade do NINJA se dá via tal
projeto, no entanto o grupo fomenta discussões sobre financiamento, que
consiste na obtenção de capital para iniciativas por meio da agregação de
múltiplas fontes de financiamento, em geral de pessoas físicas interessadas nos
projetos
O
Ninja surge como um novo veículo de comunicação, utilizando o Facebook como
principal via de escoamento dos seus produtos, com postagem de fotografias em
tempo real, vídeos do YouTube e links de coberturas ao vivo via stream
(utilizando a denominação PósTV para essa prática). A primeira cobertura via
Mídia Ninja aconteceu em março de 2013 durante o Fórum Social Mundial, na
Tunísia, no entanto foi com a explosão das manifestações populares, em junho do
mesmo ano, no Brasil que o coletivo se expandiu e ganhou repercussão internacional.
Para
entender um pouco mais sobre o processo, o “Gambiarra Entrevista” desta semana
conta com Rafael Vilela, um dos integrantes do circuito Fora do Eixo e do
Ninja, que esteve em Vitória da Conquista no último dia 15 participando do
projeto “Conversas Infinitas no Centro de Cultura”. entrevista faz parte da
pesquisa “Ninja – Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação: Processos
produtivos da informação em um veículo de comunicação independente.”, trabalho
de conclusão de curso do nosso repórter Rafael Flores.
Rafael Flores: Como tem se
estabelecido a estrutura de trabalho do Ninja?
Rafael Vilela: Houve um
aperfeiçoamento, foi um processo muito grande de chegar no que a gente tem hoje
desde estar na rua produzindo conteúdo até possuir uma rede articulada. O Ninja
surge a partir de uma estrutura já desencadeada pelo Fora do Eixo, seja física,
quando falamos das casas, das sedes, dos coletivos, dessa estrutura mais
territorializada, seja das tecnologias sociais que permitiram a gente estar
nesse lugar. A capacidade de gestão, de agregar, de projetos, de tecnologias de
gestão colaborativa em rede, tudo isso já tinha um acúmulo pra quando o Ninja
estoura a gente tena um preparo pra esse crescimento. A rede (Fora do Eixo)
toda se vira pro Ninja em termos de trabalho e faz com que ele consiga crescer
de uma maneira sustentável. Toda essa visibilidade teve um feedback, todos os
milhares de e-mails que a gente recebeu desde junho foi respondido. Então, quem
hoje estaria preparado pra isso, sem um real no bolso, acho que isso é um fator
definitivo pra esse crescimento.
Rafael Flores: Qual o balanço do
Ninja em 2013? Em tão pouco tempo vocês conseguiram uma repercussão inédita na
mídia independente.
Rafael Vilela: A barreira da
difusão foi quebrada né? A gente tinha há muitos anos na produção independente,
um jornalismo, um midialivrismo, midiativismo muito ativo, inclusive com toda o
histórico do Centro de Mídia Independente, do Indie Mídia, toda essa história
aí a gente chegou a um ponto que chegamos a um público muito amplo. Essa
barreira da difusão, de conseguir chegar nas pessoas, acho que foi isso que foi
quebrado agora, pra mim esses eram um dos grandes desafios. Agora é a hora da
gente qualificar a produção ao tempo que a gente democratiza o acesso ao
máximo. Pode soar coisas de uma certa maneira, contraditórias, mas como a gente
tem cada vez mais gente fazendo isso e cada vez com uma qualidade maior, que a
gente consiga avançar no jornalismo investigativo, nas múltiplas editorias.
Acho que tem todo um processo aí que está em curso que já está acontecendo em
um certo sentido e é uma prova de fogo também de como essas estrutura
independentes conseguem combater com versões mais complexas de narrativas mais
qualificadas.
Rafael Flores: Para você há uma
crise no jornalismo?
Rafael Vilela: Há uma crise do
modelo industrial do jornalismo e ela está muito visível, sendo um tema muito
visceral principalmente pra quem está nas ruas. E acho que foi uma pauta
transversalizada, do anarco punk aos coxinhas do “gigante acordou”,a democratização dos meios de comunicação e
toda a discussão em cima da própria comunicação como tá colocada foram pontos
fundamentais nos debates de junho e nas pautas que vieram à tona. Então acho
que existe uma consciência das pessoas sobre o processo da mídia que é inédita
isso gera consequências complicadas, como a expulsão dos jornalistas das
manifestações. Não que a única diferença entre a gente e eles seja essa, mas na
prática hoje a gente tem uma empatia e uma capacidade de diálogo com os
manifestantes e com os movimentos sociais que é muito maior do que qualquer
veículo tradicional.
Rafael Flores: Vocês não costumam
separar o ativismo do jornalismo, em que isso implica?
Rafael Vilela: A gente já pauta o
Ninja como Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação desde o começo. Quando
as pessoas perguntam se o que a gente faz é jornalismo, o que eu tenho tentado
responder em geral é que também é jornalismo. O jornalismo é uma das coisas que
a gente faz, é uma ferramenta importante, tem seu papel, assim como a ação
direta tem uma relevância e uma capacidade de pautar narrativas de um modo
também muito eficiente. O que a gente tá disputando é narrativa, cara, se isso
vai vir a partir de um ato simbólico que junta 3 mil pessoas na Lapa ou se vai
ser com uma cobertura, o que interessa é se a gente consegue criar novos
imaginários.
Temos
uma lógica que é dual também, a gente tem o veículo e tem a rede, tem a rede
formando e capacitando a galera e tem o veículo difundindo os fatos pra
milhares de pessoas. Não dá pra separar jornalismo de ativismo, ao mesmo tempo
que você tá documentando você tá divulgando, entendeu? Acho que uma coisa tá
intrínseca a outra, a gente tá falando de ativismo junto com jornalismo e o
próprio ato a gente entende como a nossa própria causa a questão do
midialivrismo.
Rafael Flores: Como funciona a
política de colaboração no Ninja?
Rafael Vilela: Somos um núcleo de
uma rede porosa e as pessoas tem muitas possibilidades de entrar e de se somar
ao processo e cada um coloca o que tem dentro da parada, soma como pode,
entendendo que tá ajudando de alguma maneira. Tem o e-mail do gmail onde a
gente recebe grande parte do fluxo, onde a gente sistematiza todos os dados dos
colaboradores cadastrados. E aí é uma forma de lidar com essa abundancia
característica dessa lógica de redes que a gente propaga que é muita gente
interessada e com tesão pra fazer as coisas acontecerem.
Rafael Flores: Mas existe algum
tipo de controle ou filtro para a postagem do conteúdo colaborativo, não?
Rafael
Vilela:
No Ninja a gente tem um conselho editorial, somos dez pessoas , pois há uma
responsabilidade muito grande porque é um veículo que lida com uma opinião
pública muito ampla. A gente tem se questionado de uma maneira paradigmática
tentando entender o que pode ser uma editoria do século XXI, né cara? Mas a
gente opera numa lógica de funil. É uma página, ‘cê’ tem de dez a quinze
postagens por dia no máximo. ‘Cê’ tem uma visibilidade muito alta, não pode ser
mal interpretado. Tem uma linha tênue aí que não é só uma questão de autonomia
ou não dos colaboradores mas uma questão de intimidade com o processo pra
entender que isso aqui é uma caminhada longa né? Que não adianta a gente ser
irresponsável agora, sabendo que o processo é mais complexo que isso.
Rafael Flores: O que é notícia para
vocês, o que é considerado importante de se divulgar?
Rafael Vilela: Tem a questão do que
a gente chama de “pautas do nosso tempo” que a gente está permanentemente
observando e que lidam com todos os debates que a gente tá tendo. Se você for
pegar o marco civil em relação a liberdade na internet, a democratização dos
meios, código da mineração em relação a própria noção de progresso e uma
questão ambiental também muito forte, A gente tem pautas macro que baseiam
nossas escolhas por interesse, por acreditar que são lutas e debates que devem
ser levados a frente.
Conheça o
documentário “Enquanto o trem não passa”, sobre a mineração no Brasil e
produzido pelo Ninja:
http://www.youtube.com/watch?v=ZZJQk3cw6Y4
Matéria: Rafael Vilela
Revista Gambiarra
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