Fundado em 1975, em
Belo Horizonte, o Grupo Corpo estrearia no ano seguinte sua primeira criação,
Maria Maria. Com música original assinada por Milton Nascimento, roteiro de
Fernando Brant e coreografia do argentino Oscar Araiz, o balé ficou seis anos
em cartaz e percorreu catorze países. Um êxito que se converteria na concretude
de uma sede própria, inaugurada em 1978. Mas, se a empatia com o público, o
entusiasmo da crítica e o sucesso de bilheteria foram imediatos, a conquista de
uma identidade artística própria, a sustentação de um padrão de excelência e a
construção de uma estrutura capaz de garantir a continuidade da companhia e o
estabelecimento de metas de longo prazo são fruto de árduo trabalho cotidiano.
De 1976 a 1982,
enquanto o sucesso de Maria Maria ainda repercutia em apresentações pelo Brasil
e diversos países da Europa e da América do Sul, o Grupo Corpo não se deu
descanso. Colocou em cena nada menos que seis coreografias assinadas por
Rodrigo Pederneiras, que assume o posto de coreógrafo-residente em 1981 e,
juntamente com Paulo Pederneiras – diretor artístico da companhia e responsável
pela iluminação e cenários dos espetáculos - acaba por moldar a personalidade e
as feições definitivas do grupo.
Em 1985, chegava aos
palcos o segundo grande marco na carreira do grupo: Prelúdios, leitura cênica
da interpretação do pianista Nelson Freire para os 24 prelúdios de Chopin. O
espetáculo, que faz sua estreia no I Festival Internacional de Dança do Rio de
Janeiro, é aclamado pelo público e pela crítica, e termina de firmar o nome do
grupo no cenário da dança brasileira.
O Grupo Corpo dá
início então a uma nova fase, na qual irá processar a gestação de uma
caligrafia e um vocabulário coreográfico únicos. A partir de um repertório
eminentemente erudito – onde figuram, entre outras, obras de Richard Strauss,
Heitor Villa-Lobos e Edward Elgar –, vai tomando forma a combinação da técnica
clássica com uma releitura contemporânea de movimentos extraídos dos bailados
populares brasileiros que se transformaria em uma marca registrada do grupo.
Em 1989 estreia
Missa do Orfanato, uma densa e grandiosa tradução cênica da Missa Solemnis
k.139, de Mozart. De dimensões quase operísticas, o balé torna-se um marco
estético tão definitivo na trajetória do grupo, que, duas décadas depois de sua
estreia, permanece em repertório.
Em 1992 emerge o
divisor de águas do Grupo Corpo: 21, o balé que firmaria a imparidade da
sintaxe coreográfica de Rodrigo Pederneiras e a inconfundível persona cênica da
companhia. A partir da sonoridade singular da oficina instrumental mineira
Uakti e dez temas compostos por Marco Antônio Guimarães, o coreógrafo deixa de
lado a preocupação com a forma e começa a investir na dinâmica do movimento,
buscando, através do desmembramento de frases musicais e rítmicas, a escritura
de uma partitura de movimentos menos pautada na construção melódica, e mais
interessada no que subjaz a ela. O resgate da ideia de trabalhar com trilhas
especialmente compostas, que havia marcado os três primeiros espetáculos do
grupo nos idos dos anos 70, permite também que ele avance na investigação de um
vocabulário identificado com suas raízes brasileiras.
Na criação seguinte,
Nazareth (1993), o fascínio de Rodrigo por transitar entre os universos
musicais erudito e o popular encontra uma oportunidade perfeita para se
realizar mais plenamente. Inspirada no jogo de espelhamento proposto em contos
e romances do ícone maior da literatura brasileira, Machado de Assis
(1839-1908), e na obra de Ernesto Nazareth (1863-1934), figura seminal na
formação da música popular no Brasil, a trilha criada pelo compositor e
professor de Teoria Literária José Miguel Wisnik permite que, a partir de uma
sólida base clássica, o Grupo Corpo leve para a cena uma bem-humorada síntese
da brejeirice e da sensualidade (in)contidas no gingado próprio das danças
brasileiras de salão.
A parceria com
autores contemporâneos dá tão certo que as trilhas especialmente compostas
passam a ser uma norma e, cada trilha, o ponto de partida para a nova criação.
De 1992 para cá, a exceção que confirma a regra é Lecuona, de 2004, onde, a
partir de treze derramadas canções de amor do cubano Ernesto Lecuona
(1895-1963), Rodrigo exercita à exaustão seu dom para a criação de pas-de-deux.
Em meados dos anos
90, o Grupo Corpo intensifica significativamente sua agenda internacional.
Entre 1996 a 1999, atua como companhia residente da Maison de la Danse, de
Lyon, França, fazendo neste período a estreia europeia de suas criaçõe Bach, Parabelo
e Benguelê.
Hoje, com 35
coreografias e mais de 2.200 récitas na bagagem, a companhia mineira de dança
contemporânea, mantém dez balés em repertório e faz uma média de 70 récitas
anuais, apresentando-se em lugares tão distintos quanto a Islândia e a Coreia
do Sul, Estados Unidos e Líbano, Itália e Cingapura, Holanda e Israel, França e
Japão, Canadá e México.
O minimalismo de
Philip Glass (Sete ou Oito Peças para um Ballet, 1994), o vigor pop e urbano de
Arnaldo Antunes (O Corpo, 2000), o experimentalismo primigênio de Tom Zé
(Santagustin, de 2002 e, em parceria com Wisnik, Parabelo, de 1997), a
africanidade de João Bosco (Benguelê, 1998), versos metafísicos de Luís de
Camões e Gregório de Mattos à luz de Caetano Veloso e José Miguel Wisnik (Onqotô,
2005), a modernidade enraizada de Lenine (Breu, 2007), a diversidade sonora de
Moreno, Domenico e Kassin (Ímã, 2009), as canções medievais de Martín Codax na
releitura de Carlos Nuñez e José Miguel Wisnik (Sem Mim, 2011) dão origem a
espetáculos de têmperas essencialmente diversas – cerebral, cosmopolita,
interiorano, primordial, existencialista, brutal, moderno, lírico – sem que se
percam de vista os traços distintivos do Grupo Corpo.
Informações:
VEJA AQUI DOCUMENTÁRIO DO EM HOMENAGEM
AO TRINTA ANOS DO GRUPO CORPO:
http://www.youtube.com/watch?v=CXpHOpQPS88